Orelhas – Como, onde e quando

ORELHAS – COMO, ONDE E QUANDO. POR GERALD DELORME – TRADUÇÃO: EDUARDO GIANESI

PARA TODOS AQUELES QUE NÃO DOMINAM AINDA CERTAS TÉCNICAS DE DESCIDA OU DE CONTROLE, MEU OBJETIVO É DE ENCORAJÁ-LOS FORTEMENTE A ADQUIRIR OU A MELHORAR O DOMÍNIO DAS “ORELHAS”

Depois de ter sido instrutor de paraglider uma boa parte do verão, a constatação dos anos anteriores me parece atualmente ainda mais evidente: a maioria dos paragliders ditos “saída de escola” ou “intermediários” atingiram tal nível de performance que mesmo um instrutor muito prudente e consciencioso pode se ver rapidamente em dificuldades para fazer um aluno “descer”.
Com a taxa de queda que os equipamentos possuíam antigamente, principalmente em curvas, o problema era facilmente resolvido fazendo o piloto executar uma pequena série de 360º, sem necessariamente ter que fechá-los demasiadamente. Mas com os paragliders atuais, a manobra não é mais tão simples, sobretudo para os pilotos em início de aprendizagem, pois os equipamentos exigem freqüentemente mais experiência para entrarem e se manterem corretamente em curvas fechadas do que para serem pilotados com “orelhas fechadas”. Daí vem o grande interesse em conhecer esse método que, vocês verão, não serve somente para descer mais rápido…
“Fazer orelhas” consiste em dobrar as pontas do velame em direção ao intradorso através da tração em cordins da fita de ataque. Com o perfil deformado desse modo, obtém-se um aumento na taxa de queda, pois se reduz a superfície de sustentação e se aumenta o arraste. Obtém-se igualmente uma nítida diminuição do alongamento, diminuindo a envergadura do velame.
ORELHAS: EM QUE SITUAÇÕES

Primeiramente, em todos os casos onde é interessante aumentar a taxa de queda. Ou seja, para encurtar um vôo bestamente, como por exemplo, no caso de se estar arriscado a chegar atrasado ao próprio almoço de casamento, ou falando sério, no caso de cansaço, para evitar se aproximar demais de nuvens não muito amigáveis ou ainda para pousar mais rápido se as condições aerológicas começam a evoluir desfavoravelmente (vento aumentando de intensidade, congestus em formação, frente de chuva se aproximando, etc.).
Da mesma forma, no caso de aproximação de muitos pilotos de uma vez em um terreno estreito, para colocar rapidamente um ranking em relação aos outros, e poder assim pousar tranquilamente sem incomodar nem ser incomodado.
Enfim, para reduzir a taxa de planeio, se após um belo vôo a aterrissagem deve ser feita em cima de um lenço, e uma aproximação em S é quase impossível ou muito delicada em função da existência de grandes árvores ao redor do terreno por exemplo.

Outra situação para fazer orelhas é uma vantagem incontestável no plano segurança: é em condições de vôo muito turbulentas.
Em um paraglider com orelhas fechadas, voa-se com uma incidência maior e, sobretudo com um velame menos alongado, e, portanto bem mais “resistente” aos fechamentos. Essa estratégia é muito mais interessante ainda na fase de aproximação para pouso, quase até o momento mesmo da aterrissagem, já que durante essas fases de vôo o piloto está a pouca altura/solo, e as conseqüências de um fechamento assimétrico podem ser as mais graves.

Enfim, para terminar esse inventário, saiba que fazer orelhas pode ser também a melhor solução em caso de problema com um comando (ruptura, nó mal feito, comando preso etc.), principalmente se o incidente acontece em condições de térmicas. Fica-se bem mais protegido que se estiver pilotando unicamente com as fitas de fuga, método que se tornou mais delicado atualmente em função dos riscos de fase de parachutagem.
COMO FAZER?

Vejamos agora como transformar um bólido de 5 de alongamento em um de menos de 3, simplesmente puxando suas orelhas.

Antes de mais nada, saiba que é indispensável usar luvas para efetuar a manobra e a manter, principalmente com os cordins atuais, cada vez mais finos. Outro detalhe importante, os comandos não devem nunca ser soltos durante a manobra. Mante-los nas mãos não incomoda de modo algum e permite ficar pronto a qualquer correção eventual.

A não muito tempo atrás eu aconselhava passar os batoques para os pulsos para fazer tranquilamente as orelhas ou outras manobras nas fitas, mas desde que eu vôo, como muitos outros, com um pára-quedas de reserva, eu preferi mudar meus hábitos para manter uma completa liberdade das mãos em caso de necessidade. Adaptação…

Em seguida vamos entrar em acordo sobre um vocabulário comum. As fitas A são as fitas de ataque, das quais saem um grupo de cordins A, fixados no intradorso perto do bordo de ataque de ponta a ponta do velame. Vêm em seguida as fitas B e a linha de cordins B, e a do mesmo modo as fitas C e D se o paraglider for equipado de 4 fitas. Para fazer orelhas clássicas, abaixa-se de cada lado o cordim A mais externo. Dependendo do paraglider 2 ou até 3 cordins podem ser abaixados de cada lado para obter o que se chama de “pequenas ou grandes orelhas”.
O GESTO

Se você puder em vôo é claro, pegar os cordins bem acima das fitas quando levanta os braços, melhor. Você é um sortudo porque a tração para baixo será fácil de fazer. Por outro lado, se você faz parte, como eu, daqueles que não tomaram sopa suficiente quando eram pequenos e que, portanto ainda não cresceram (!), as coisas podem ser diferentes.

Na verdade, se de braços levantados você não alcança mais que poucos centímetros acima das malhas rápidas, o começo da tração nos cordins deverá ser feito muito mais para os lados do que para baixo.

Por um lado para facilmente conseguir alcançar os cordins mais para cima, fazendo os dedos avançarem aos poucos durante a tração, como um “para pianista médio”.

Por outro lado isso permite evitar um eventual começo de fechamento frontal devido a uma tração para baixo que, por falta de amplitude, não apenas abaixará um ou dois cordins, mas toda a fita A.

Que os grandes riam enquanto os pequenos treinam é uma injustiça enorme.
Eu também diria, de passagem, para os pilotos de paraglider duplo interessados em fazer orelhas facilmente, que instalar em casa um par de alças com polias para puxar os cordins é muito prático, sobretudo quando se usa o paraglider profissionalmente.
A AÇÃO

Primeiro objetivo, se familiarizar com a manobra, partindo sempre se um paraglider bem estabilizado. Não se passa subitamente de uma posição de batoques baixos a uma posição braços elevados, e se joga sobre os cordins A.
Nesse caso não serão apenas as orelhas que vão descer, mas também a parte da frente e a de trás do velame!

Portanto, deixe o paraglider voar 2 ou 3 segundos em posição de braços elevados antes de fazer o gesto, que deve ser feito sem brutalidade, mas firmemente, porque se alguns paragliders são dóceis, outros resistem às vezes antes de aceitar se dobrar.

Para o número de cordins a puxar, mesmo se um amigo confiável fala para ir direto com 2 ou 3 cordins de cada lado, descubra tranquilamente a manobra apenas com um cordim de cada lado, para ver por si mesmo, embaixo do velame, se as pontas se recusam efetivamente ou não de passar por baixo do intradorso. Já será de todo modo uma boa aprendizagem para esses novos gestos.
E pronto, as orelhas estão lá, colocadas embaixo do intradorso! Agora, para restabelecer um vôo normal, o mesmo conselho de antes.
Deixe o paraglider se estabilizar, depois simplesmente relaxe os cordins.
Ou as pontas do velame voltam sozinhas, ou é necessário apenas abaixar ligeiramente e simetricamente os dois batoques para soltar as orelhas. Certos paragliders podem demorar a abrir. Nesse caso é necessário repetir o gesto com os batoques, às vezes com maior amplitude, mas sempre sem violência.
Não hesite em repetir a manobra muitas vezes durante vôos tranqüilos, a fim de ser capaz de fazê-la sem nenhuma hesitação nem apreensão no dia em que estiver em uma situação difícil.

Em todos esses primeiros testes, que você fará sem dúvida em um local já conhecido, longe do relevo, em boas condições aerológicas e a boa altura/solo, tenha sempre o bom hábito de manter sua direção de vôo.
É muito fácil nas primeiras vezes desviar para a direita ou para a esquerda enquanto se mexe na sellette para alcançar os cordins o mais alto possível, ou de virar na hora que uma ponta do velame se enche de ar primeiro que a outra.
Nesse caso, será necessário às vezes compensar do lado aberto, com a sellette ou o batoque, enquanto você se ocupa em abrir a orelha teimosa. É imperativo saber manter uma direção em todas as circunstâncias.
PARA DESCER RÁPIDO, QUEM SABE MUITO RÁPIDO

Se o negócio é simplesmente encurtar um vôo, nós nos contentamos de fazer pequenas orelhas. Se há urgência, pode-se passar às grandes orelhas, pegando dessa vez dois ou três cordins de cada lado.
Se o paraglider não aceita (movimento fisicamente difícil ou tendência ao fechamento frontal), outra solução consiste, a partir de orelhas clássicas, de descer os cordins mais baixo fazendo correr os dedos, ou a juntar os cordins em uma só mão, para alcançar mais alto com a outra mão correndo sobre o feixe de cordins, para ganhar uns vinte centímetros, e retomar em seguida uma posição simétrica sempre mantendo a tração.

Descrita desse modo a manobra pode parecer fantasiosa, mas quando não se tem braços de orangotango, a gente se vira, e posso dizer que isso funciona muito bem em meu Sphinx com meus 1,65 metros!

Se o centro do bordo de ataque mostra às vezes certa tendência a querer fechar na hora de fazer grandes orelhas, tente fazer a tração de modo assimétrico, com uma pequena diferença de tempo entre os dois lados.
Você quer descer ainda mais rápido? Sem problemas, é suficiente nesse caso de juntar orelhas e acelerador, começando é claro pelas orelhas. Saiba que nessa configuração o esforço para manter os cordins pode ser, dependendo do paraglider, diminuído ou aumentado. Por outro lado, a estabilidade do perfil é freqüentemente “concreto”.

Pelo que acabamos de ver, a vantagem é de poder conservar uma direção de vôo, o que permite avançar para sair de uma zona perigosa ou se dirigir em direção a um pouso descendo mais rápido, contrariamente ao que ocorre em uma série de 360º ou em uma descida em B Stall.

Sempre mais rápido ? Então dessa vez é necessário juntar orelhas e 360º. Atualmente, na minha modesta opinião, é o método de descida mais radical, porém ainda seguro, e executável pela maioria dos pilotos com um pouco de treinamento.
Essa manobra pode ser muito mais facilmente mantida e por mais tempo que uma série de 360º clássicos, porque os efeitos da força centrífuga são menores, e psicologicamente a configuração é mais acessível que uma descida em B Stall.

Nesse caso também os trabalhos práticos são indispensáveis porque a entrada e a permanência em curva fechada precisam de um pouco de hábito. Alguns paragliders necessitam que se faça um começo de curva para um lado para em seguida aproveitar da rolagem para entrar na curva do lado oposto.
Fica a seu cargo descobrir com treinamento. Por outro lado, em presença de vento forte, não se esqueça que essa descida pode causar uma deriva importante. É, portanto uma técnica para ser adotada em função da força do vento e de sua posição em relação ao pouso…
AVANÇA-SE MAIS RÁPIDO?

Durante a discussão sobre o assunto, é ainda freqüente ouvir dizer que fazer orelhas permite avançar mais rápido.

É falso na maioria dos paragliders, e pouco verdadeiro para alguns raros modelos.
A causa desta ilusão freqüente é que com orelhas a taxa de queda e a velocidade na trajetória aumentam, mas a velocidade horizontal permanece a mesma, ou diminui ligeiramente em muitos equipamentos. Alguns exemplos simples.
Um paraglider, voando picado, desce a 2 m/s e voa a 36 Km/h na trajetória. Com pequenas orelhas desce a 4 m/s e voa a 38 Km/h na trajetória. Enfim, com grandes orelhas desce a 6 m/s e voa a 41 Km/h na trajetória. E com 36 Km/h de vento de frente, qualquer que seja a configuração escolhida, esse paraglider voará para trás, ligeiramente sem dúvida, mas será marcha a ré! A solução completa está no teorema de Pitágoras ou em alguns livros…
Portanto, as orelhas para descer mais rápido sim, mas para avançar mais rápido não, a menos que se use junto o acelerador.
ORELHAS “ANTI-FECHAMENTO” OU “ESTABILIZADORAS”

Você sabe que em condições térmicas fortes ou muito turbulentas o risco de fechamento é principalmente das pontas do velame. Nada de misterioso já que são as partes menos rígidas do perfil. Daí o grande interesse em “retira-las” fazendo orelhas! Esse reflexo deve vir à sua mente assim que você pensar estar em dificuldades para controlar seu paraglider, principalmente na fase de aproximação (um fechamento forte é muito mais perigoso quanto menor a altura/solo).
Mas como “aproximação” significa classicamente “curvas” a fazer para se posicionar corretamente em relação ao pouso, será necessário que seu paraglider possua uma qualidade extra: a maneabilidade com orelhas fechadas.

Qualidade infelizmente nunca testada nos ensaios de equipamentos, o que é lamentável em minha opinião com a evolução dos pilotos e dos materiais.
Eu diria até que é um dos elementos a mais a ser analisado na hora de hesitação entre dois modelos que se pretende comprar. Paciência, os responsáveis por testes vão reagir… Na maioria dos paragliders, a maneabilidade com orelhas depende em grande parte do tipo de sellette e principalmente da regulagem da tira peitoral, já que a pilotagem é feita unicamente pelo deslocamento do corpo (os batoques não podem ser usados com as orelhas).

Só há uma boa maneira de saber como fazer: é preciso treinar.
Todos os tipos de curvas devem ser redescobertas, como nos primeiros vôos, e com diferentes regulagens da tira peitoral porque o tempo de resposta, o raio da curva, as sensações e a taxa de queda são diferentes. Uma vez bem informado, a etapa seguinte consiste em realizar, em boas condições, diferentes aproximações nessa configuração.

Nas primeiras vezes, reabra as orelhas na fase final e a uma altura/solo razoável. Além disso, durante os testes saiba que com um bom vento no solo alguns paragliders aceitam muito bem um só gesto para abrir e “arredondar” ao mesmo tempo. No entanto fique bem atento aos problemas de gradiente, e faça o progresso como se deve: etapa por etapa.

Alguns de vocês terão talvez a desagradável surpresa de ver que seu paraglider não é totalmente manejável com orelhas fechadas. Devido a uma sellette com cruzilhões ou mesmo às vezes com a tira peitoral totalmente solta. Nesse caso, se você estiver um dia em dificuldades, será necessário analisar bem a situação a fim de poder fazer a aproximação em linha reta mais longa possível, para se beneficiar apesar de tudo, das vantagens de voar com orelhas fechadas.

Sem tentar “recrutar” ninguém, saiba que as boas escolas ensinam normalmente a fazer essas manobras com rádio nos estágios de aperfeiçoamento assim que o nível do piloto permitir.

É, para os mais “tímidos”, a melhor maneira de passar pelos pontos técnicos indispensáveis à prática regular e segura do paraglider em condições térmicas.
E não é preciso sol nem de longo estágio para treinar, é possível se fazer em qualquer estação do ano. Última coisa, uma vez que você domine bem a manobra, não abuse muito dela: pense em como os pobres cordins são solicitados!
Em conclusão, eu não posso evitar repetir. Com os paragliders atuais, fazer orelhas não é reservado para os pilotos que voam todos os dias. Portanto, não deixe de fazer no próximo vôo uma aprendizagem que um dia poderá lhe prestar uma grande ajuda.

Sua segurança será reforçada, assim como sua tranqüilidade e seu prazer de voar, e seu sorriso será tão grande que fará também mexer suas orelhas!

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